Enock Sacramento
Conheci Herê Fonseca no final dos anos 90, na condição de
membro da Comissão Julgadora do Mapa Cultural Paulista. O contato com o jovem
artista foi breve, mas intenso. Seu interesse pelas questões relacionadas com a
arte extrapolava os limites convencionais. Queria saber mais, questionar sobre
critérios, sobre possibilidades do fazer artístico. Lembro-me de ter-lhe dito que a arte não é o
domínio do real, mas do possível, que ela não se refere ao que é, mas ao que
pode ser. E que a missão do artista, na visão de Paul Klee, não é a reprodução
da realidade, mas a produção de uma nova realidade, independente e autônoma.
Perdi, na
sequência, contato pessoal com o artista, de quem me chegavam notícias, de
quando em vez e por meios diversos, dando conta que ele continuava muito
atuante em Piracicaba, onde participava dos eventos artísticos mais
significativos da cidade e na qual realizava exposições individuais de peças
tridimensionais, espécie de garatujas metálicas aéreas, sustentadas por fios
presos ao teto, de esculturas espaciais, que se configuram como um desenho no
espaço e que originam novas linhas ao serem projetadas como sombras nas
paredes. O movimento provocado pelo vento ou pelo toque remete a um espetáculo
mágico de matérias, luzes e sombras, sutil, harmonioso ou agitado em função de
interferências suaves ou incisivas. Trabalhos nessa linha de pesquisa constituem contribuição original de Herê na
produção de uma nova realidade, a de seu universo artístico, que tem peso e
leveza ao mesmo tempo, material e imaterial, e com a qual ele constrói uma
poética próxima à da dança. Paralelamente, ele desenvolve uma outra série de
pinturas e de trabalhos em que peças de arame são incorporadas a pinturas.
Imagino que Herê
lembrou-se por acaso do crítico que com ele cruzou há mais de 10 anos em São
Paulo. Em novembro de 2009, o Jornal da ABCA – Associação Brasileira de
Críticos de Arte, em seu numero 22, publicou a notícia do lançamento de um
livro de nossa autoria e, concomitantemente, uma consubstanciada matéria sobre
a obra de Herê Fonseca, referenciado na exposição “Oscilações”, realizada no
SESC Arsenal, de Cuiabá, redigida pela critica, professora e curadora Ludmila
Brandão. Foi nesta ocasião que tive notícias mais recentes do artista, que ele
mudou-se para Mato Grosso, onde vive e trabalha atualmente.
Agora,
inesperadamente, sou convidado pelo artista, por intermédio da profa. Maria
Thereza Azevedo, a redigir um texto sobre ele para a nova exposição que realiza
no MACP: Cubo Negro. Não poderia, de
forma alguma, declinar-me da tarefa, mesmo não tendo visto a obra a vivo, como
seria desejável. Informações e imagens
me foram enviadas. Desta feita, Herê mostra, no interior de um cubo, uma série
de esboços em guache preto sobre papel branco, visíveis com o auxílio de lanternas
penduradas no interior do espaço. A instalação sugere uma viagem às origens da
criação, à morada das idéias que se transformam, através da sensibilidade e do
gesto do artista, em linhas e manchas, signos e sinais. Herê, que em outros
momentos desenhou no espaço, desenha agora no piso e nas paredes internas de um
cubo, espécie de útero em que a obra de arte é gerada. Em ambos os casos,
todavia, Herê pratica o que Merleau-Ponty denominaria de uma teoria mágica da
visão.
Enock Sacramento
Membro da ABCA - Associação
Brasileira de Críticos de Arte
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